O que escrever
O que escrever? É a pergunta que faço todos os dias ao
acordar e me levantar. A minha tortura escrita começa na madrugada quando
vasculho a minha memória na tentativa de encontrar o sono perdido em algum
lugar do passado. O meu sono-sonhado é fragmentado que mistura lembranças,
passagens, avisos, mensagens e também pesadelos.
O que escrever? Puxo na minha história se há a
obrigação para escrever todos os dias. Penso comigo se o ser humano nasce com a
missão de deixar registro nos papeis da sua trajetória na vida terrestre.
Acredito que o nosso DNA tem marcado nas suas entranhas o nosso perfil
linguístico e/ou escriba. Mas, e daí! Exclamo eu indignado e reflexivo porque a
minha inspiração nem sempre está em alta ou talvez eu não tenha tido a felicidade
de participar de uma das mais importantes revoluções que aconteceu há mais de
70 mil anos: a Revolução CognitivaO que escrever? Olho pro lado, já sentado à mesa para
o café da manhã, após alimentar os bichos que me cercam ávidos de fome, e me
vejo ao avesso e sem qualquer palpite para transportar para o papel, ou melhor,
para o monitor do meu computador. Pausadamente coloco o açúcar mascavo na
xícara, três ou quatro colheres pequenas, em seguida despejo o café bem forte, uma
dosagem de leite e misturo ligeiramente os três ingredientes que farão parte da
minha dieta, além das torradas integrais banhadas com manteiga sem sal ou
qualquer tipo de queijo.
O que escrever? Antes de partir para a escola ainda
vasculho o meu cérebro em busca de motivos que me levam a escrever todos os
dias uma, duas ou dezenas de linhas só para marcar o ponto. Mas num relâmpago,
aquele que nasce e morre em segundos, mas que deixa estragos ou vislumbres, me
volto aos tempos da graduação e pós. Ah! Agora entendi o porquê que me cobro
todos os dias. A vida acadêmica é bela, conquistamos conhecimentos, desvendamos
o óbvio e sacamos que somos ignorantes. Aqui me remeto aos pensadores
pré-socráticos, que, segundo eles, devemos assumir de forma límpida a nossa
ignorância, porque só assim teremos condições de buscar respostas para as
nossas dúvidas.O que escrever? Os títulos conquistados – com muita
luta, rigor, dedicação e amor ao texto – ao mesmo tempo que nos enobrece nos
deixa de quatro. A sensação é que assinamos uma carta compromisso que devemos
escrever sempre, independente da nossa inspiração ou do conteúdo teórico que adquirimos
com leitura e com a experiência de vida {empírico, que é partida em direção à
ciência}. Os anos se passaram e percebo que estou preso a um tempo que me fez
muito feliz porque a escrita nascia do nada, como dizia o cronista Rubem Braga.
Hoje me torturo, não assimilo o bullying psicológico que me segue e não consigo
me desvincular do sentimento de culpa que bate à porta. Como me sinto moribundo
toda vez que me pego pensando no que escrever.Escrever por escrever não me sinto livre, se é que
somos livres, ou espontâneo para expressar o meu vocabulário de palavras num
contexto histórico e político.
O que escrever.
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